Caro Rodrigo,
Obrigado pelo seu comentário.
De fato, uma distinção entre o caráter explicativo de uma teoria e seu caráter preditivo é bem importante e merece uma discussão detalhada.
O que poderíamos avançar, num primeiro momento, é o seguinte.
Uma teoria (ou uma hipótese), quando bem sucedida, é uma espécie de rua de mão dupla. Ela volta-se para trás para explicar o passado e para frente para predizer o futuro.
Em termos mais técnicos, o modelo hipotético-dedutivo de uma teoria traz consigo um caráter explicativo quando as conseqüências lógicas extraídas da mesma se referem a acontecimentos passados, e traz consigo um caráter preditivo quando as conseqüências lógicas se referem a acontecimentos futuros.
Para dar mais concretude ao dito acima. Peguemos a teoria newtoniana da gravitação, por exemplo. Nós podemos utilizá-la para explicar por que o cometa Halley passou perto da órbita terrestre em 1910 e em 1986.
Nesse caso, as equações matemáticas que descrevem os movimentos dos corpos celestes adequam-se bem aos fatos até aqui observados e estabelecem que o cometa possui uma trajetória tal que, grosso modo, se repete a cada 76 anos.
Essa lei proposta tem, assim, um caráter explicativo quando se refere a eventos que se passaram de acordo com suas premissas. De outro lado, podemos utilizar a mesma teoria/lei para prever que o cometa poderá ser novamente avistado daqui a cerca de 52 anos.
Num certo sentido, podemos notar, uma explicação é uma espécie de “predição direcionada a um evento passado”.
Isso pode parecer trivial, mas não é.
Assim, uma teoria pode ser falsificada tanto por falhar em prever um evento futuro — digamos que o cometa Halley passe em 2.072, e não em 2.062, como previsto — quanto em “prever” um evento passado.
Num exercício de imaginação, suponhamos que encontrássemos registros minuciosos de observação astronômica que nos descrevessem a aparição do cometa Halley em 1899 e 1855. Nesse caso, a teoria presente falharia em explicar tais aparições, já que ela “prevê” aparições separadas uma da outra por exatos 76 anos.
Obviamente, como em outros casos, teríamos duas grandes opções. Desconsiderar a potencial evidência refutadora (poderíamos alegar que tais registros não são confiáveis) ou revisar a teoria.
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No caso de teorias filosóficas, nós podemos dizer que, embora seu aspecto preditivo seja menos aparente, ele não deixa de existir.
Suponha, por exemplo, uma teoria epistemológica, que descreve os requisitos e virtudes principais que uma teoria científica bem sucedida deve possuir. Ora, o que devemos observar é que aí está implícita pelo menos uma predição: que teorias que não satisfaçam tais condições serão, em regra, menos bem sucedidas do que aquelas que as satisfazem. Funcionará como contra-exemplo, portanto, apresentar teorias (proporcionalmente mais) bem sucedidas que não seguem tal modelo proposto.
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Uma excelente leitura — bem fluida e proporcionalmente fácil — que trata desse e outros tópicos filosóficos centrais é The Web of Belief, de Quine.
Interessado em aprofundar seus conhecimentos filosóficos, particularmente sobre Quine, empirismo e teoria da ciência/epistemologia?